Restrições: como os controles de exportação estão reconfigurando os mercados

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As tensões geopolíticas continuam aumentando e governos de todo o mundo ampliam as restrições ao que empresas nacionais podem vender no exterior. A maioria dos líderes empresariais já está familiarizada com os controles de exportação que afetam itens militares ou de uso duplo (i.e., aqueles com aplicações tanto militares como civis); mais difícil de desvendar são as complexas restrições de controle das exportações que os governos poderão implementar, ou já implementaram, visando objetivos políticos que afetam a segurança tecnológica e econômica de seus países.

Por exemplo, foram controles de exportação que definiram a corrida para implantar a infraestrutura de comunicações móveis e que estão moldando os setores de inteligência artificial, semicondutores e computação quântica em todo o mundo. As chamadas indústrias legadas também são restringidas por controles de exportação, como as regras de criptografia que afetam quase todos os softwares comerciais. Além disso, cada vez mais os governos têm controlado a quais compradores as empresas domésticas podem vender até mesmo certos itens puramente civis: desde 2019, o número de compradores que sofrem algum tipo de restrição mais que dobrou nos Estados Unidos. E no ano passado a União Europeia decidiu que as empresas da região serão responsáveis por assegurar que seus compradores impeçam que itens industriais e comerciais (como câmeras de vídeo e fontes de computador) cheguem à Rússia e à Bielorrússia..

O aumento constante de controles de exportação é um desafio significativo para as estratégias globais das empresas, pois até mesmo quantidades mínimas de materiais restritos podem fazer com que um produto sofra restrições. Os controles de exportação constituem desafios diferentes dos demais controles comerciais: embora, como as tarifas, costumem ser incluídos nas negociações diplomáticas, os controles de exportação geralmente decorrem de preocupações com a segurança nacional. Assim, os governos às vezes implementam restrições à exportação unilateralmente e com vigência imediata, pegando desprevenidos os líderes das empresas.

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Além disso, embora a maioria dos países divulgue dados referentes a importações e taxas alfandegárias – normalmente organizados segundo os códigos do Sistema Harmonizado (SH), um padrão internacional de números e nomes utilizado para classificar mercadorias —, as informações sobre controles de exportação costumam ser menos disponíveis e geralmente não estão vinculadas aos códigos do SH, tornando mais difícil identificar e analisar tendências. Por exemplo, quando os Estados Unidos intensificaram o controle sobre a exportação de semicondutores para a China, toda a mídia previu que a exportação de chips americanos para aquele país cairia vertiginosamente; no entanto, os novos controles visavam apenas um subgrupo limitado de chips avançados e diziam respeito mais às ferramentas para fabricá-los. O resultado, contraintuitivamente, foi um aumento das exportações de chips americanos para a China em alguns anos e nenhum impacto perceptível nas tendências de mercado nos demais anos (Quadro 1).

A proliferação de controles de exportação contribui para criar um cenário comercial cada vez mais complexo que está pondo à prova a resiliência das corporações multinacionais. Por outro lado, como observamos neste artigo, as empresas que souberem monitorar e compreender as implicações das novas normas de exportação poderão transformá-las em uma oportunidade e tomar a dianteira de concorrentes menos perspicazes.

Os fundamentos dos controles de exportação

Controles de exportação se aplicam a bens, serviços, softwares e tecnologias. Eles limitam a movimentação de produtos e serviços sensíveis através de fronteiras internacionais, regulam o acesso de estrangeiros à tecnologia nacional e impedem que certos itens cheguem a usuários finais específicos ou tenham usos finais específicos. Diferem dos controles de investimentos (por exemplo, os impostos sobre investimentos estrangeiros diretos, que visam regular o fluxo de capital) e das sanções, que restringem principalmente as transações financeiras.

Embora existam há tanto tempo quanto os embargos, os controles de exportação foram formalizados após a Segunda Guerra, durante a corrida armamentista e tecnológica da Guerra Fria. Em 1996, o Acordo de Wassenaar substituiu os mecanismos de controle das exportações da época da Guerra Fria e criou um sistema unificado e transparente para conter a proliferação global de armas e de itens de uso duplo. Além do Acordo de Wassenaar, ratificado por 42 países membros, vários regimes multilaterais regem o comércio das tecnologias de mísseis e drones, combustível nuclear e agentes químicos e biológicos. Entretanto, as tensões geopolíticas recentes dificultaram que organizações multilaterais chegassem a um consenso sobre medidas de controle, particularmente as que afetam a tecnologia, o que levou alguns países membros a impor controles unilaterais ou plurilaterais. Com isso, hoje as empresas se deparam com múltiplas normas nacionais e internacionais simultâneas de controle das exportações.

Segue um panorama das principais políticas de controle das exportações nas três maiores economias do mundo:

  • Estados Unidos. Os Departamentos de Estado, Energia e Comércio regulam os controles de exportação de bens e serviços em seus respectivos domínios. O Departamento de Estado administra a Lista de Munições dos EUA, referente a itens militares sensíveis; o Departamento de Energia, em conjunto com a Comissão Reguladora Nuclear, supervisiona produtos e serviços relacionados à energia nuclear; e o Departamento de Comércio maneja a Lista de Controle do Comércio, que inclui itens menos sensíveis de defesa e de uso duplo, bem como produtos não controlados por outros órgãos. Em todos os casos, há restrições não apenas a itens produzidos internamente, mas também aos fabricados fora do país que ultrapassarem determinados limiares de conteúdo controlado. As empresas precisam obter licenças de exportação, ou recorrer a isenções de licença em alguns casos, se quiserem exportar bens controlados para destinos e usuários finais aprovados.
  • China. Em 2020, a China promulgou a Lei de Controle de Exportação, seguida de regulamentações detalhadas em outubro de 2024. O Ministério do Comércio supervisiona as principais listas de itens controlados do país, emite licenças e garante o cumprimento das restrições às exportações. Tornou-se o principal órgão na resposta da China aos controles de exportação ocidentais direcionados à sua indústria avançada e vem impondo restrições cada vez mais rigorosas às empresas ocidentais.1 O Ministério do Comércio, em colaboração com as autoridades aduaneiras da China, também impôs restrições à exportação de minerais de terras raras e outros materiais essenciais utilizados na cadeia de suprimentos de semicondutores.
  • União Europeia. A Direção-Geral do Comércio da Comissão Europeia coordena os controles de exportação em toda a UE, que no geral são implementados pelos países membros, os quais podem complementá-los. Em março de 2023, por exemplo, a Holanda seguiu o exemplo dos Estados Unidos e impôs controles sobre tecnologias de semicondutores, que não sofrem restrições de outros membros da UE; e no ano seguinte a França instituiu controles de exportação sobre tecnologias relacionadas à computação quântica. Uma mudança notável ocorreu em novembro de 2024, quando a União Europeia exigiu que as empresas garantissem que seus clientes não venderiam certos produtos para a Rússia ou Bielorrússia – a aplicação extraterritorial de maior visibilidade da entidade até o momento.

Tendências dos controles de exportação que afetam o comércio global

As corporações multinacionais e os exportadores e importadores globais enfrentam um cenário comercial cada vez mais complexo, cujas três principais causas são: proliferação de restrições, rompimento de alianças e presença cada vez mais forte de autoridades extraterritoriais.

  • Proliferação de restrições. Uma tendência importante dos controles de exportação é sua ininterrupta expansão. As listas de itens restritos emitidas por organizações multilaterais aumentam constantemente em tamanho, escopo e complexidade. Cada ano traz novos controles sobre ainda outros grupos de produtos2, enquanto produtos legados não são retirados das listas. Por exemplo, os algoritmos de criptografia simétrica com chaves de 56 bits continuam nas listas de restrições, embora esses algoritmos estejam amplamente disponíveis desde a década de 1970.

    Simultaneamente, o número crescente de medidas unilaterais vem complicando ainda mais o cenário dos controles de exportação. Mesmo empresas que vendem produtos idênticos podem estar sujeitas a restrições de exportação diferentes. Por exemplo, as novas restrições americanas a produtos de IA generativa estipulam normas diferentes dependendo de onde a empresa opera. A Lista de Controle do Comércio dos Estados Unidos, que espelhava a Lista de Munições multilateral do Acordo de Wassenaar na década de 1990, hoje contém centenas de itens adicionais específicos ao país. A Lista de Entidades do Departamento de Comércio – uma compilação de empresas e organizações estrangeiras sujeitas a restrições de exportação – cresceu de 1.350 inscrições em 2019 para aproximadamente 3.350 em março de 2025 (Quadro 2). China, Japão e Holanda, entre muitos outros países, também expandiram seus respectivos controles em setores chave, como semicondutores e energia nuclear.

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  • Rompimento de alianças. Historicamente, os controles de exportação eram parte de regimes multilaterais, o que tendia a criar condições equitativas para empresas de países tecnologicamente avançados. No entanto, tensões geopolíticas e a competição tecnológica estão levando alguns governos a aumentar a grau de coordenação. Por exemplo, os Estados Unidos organizaram uma coalizão de países especificamente para implementar controles de exportação em resposta à invasão russa da Ucrânia. Posteriormente, o boom da IA generativa levou a novas restrições americanas a empresas que operam em países com elevado poder computacional, mas excluíram alguns aliados dos EUA. Essas mudanças nas alianças complicam o planejamento estratégico das empresas e sua capacidade de reagir às correntes geopolíticas.
  • Presença cada vez mais forte de autoridades extraterritoriais. Regulamentações que se estendem além das fronteiras de um país representam outro desafio de compliance para os exportadores. O Departamento de Estado, por exemplo, aplica a chamada “norma transparente” [see-through rule] do seu Regulamento sobre o Tráfico Internacional de Armas (ITAR), que controla produtos de defesa fabricados fora do país que contenham qualquer vestígio de conteúdo controlado pelos EUA. A experiência de um fabricante aeroespacial europeu serve como um alerta: a empresa anunciou seu sistema de satélite como sendo “compatível com o ITAR”, mas logo descobriu que, devido a um pequeno subcomponente controlado, o sistema inteiro estava sujeito às restrições de exportação dos EUA e não poderia ser exportado ou implantado na China conforme planejado. O Departamento de Comércio possui suas próprias regulamentações complexas, que abrangem itens não americanos, como as normas “de minimis” e as referentes a “produtos diretos produzidos no exterior” (FDP). Essas normas estendem a jurisdição americana a itens fabricados fora dos Estados Unidos caso contenham níveis específicos de conteúdo controlado pelo país ou tenham sido produzidos com expertise ou ferramentas americanas (mesmo que não contenham qualquer conteúdo americano).

    Do mesmo modo, as novas regulamentações de controle das exportações da China também se estendem a atividades fora do país, seguindo aproximadamente as normas de minimis e FDP do Departamento de Comércio. E, conforme observado acima, a União Europeia agora exige que as empresas europeias realizem monitoramento extraterritorial para assegurar que seus produtos não sejam utilizados na Rússia ou Bielorrússia.

Como os controles de exportação estão impactando os diversos setores da economia

Por quase uma década, os Estados Unidos e a China vêm implementando controles de exportação crescentes a semicondutores, telecomunicações e manufatura avançada. O impacto sobre as empresas em ambos os países tem sido significativo. Um estudo do Federal Reserve Bank de Nova York constatou que, quando os clientes chineses de empresas americanas foram incluídos em listas de controle de exportação, o preço das ações dessas empresas americanas caiu 2,5%, em média. Os autores do estudo estimam que tais controles fizeram com que o valor de mercado dos fornecedores americanos afetados caiu $857 milhões e que a perda total de todos os fornecedores chegou a quase $130 bilhões.

Houve disrupção em muitas empresas, provocada pela recente onda de controles americanos, chineses e europeus sobre as exportações. Por exemplo, a Western Digital e a Toshiba optaram por suspender as vendas para o setor de telecomunicações da China depois que os Estados Unidos introduziram controles de exportação em 2020. A Seagate, por outro lado, decidiu continuar vendendo para uma empresa chinesa por meio de afiliadas offshore. O governo dos EUA concluiu que a Seagate violou a regra FDP e impôs uma multa de quase $300 milhões. Em outro caso, quando os governos americano, holandês e japonês impuseram restrições aos fabricantes chineses de semicondutores, a SMIC, a maior produtora de semicondutores da China, sofreu uma queda no faturamento e migrou para outros mercados.

Embora no curto prazo os controles de exportação possam provocar a disrupção almejada pelos formuladores de tais políticas, o impacto de longo prazo pode até ser contrário a seus objetivos. O surgimento do DeepSeek chinês como um modelo competitivo de inteligência artificial, por exemplo, sugere que as restrições à exportação impostas pelos Estados Unidos talvez tenham acelerado a inovação local, incentivando as empresas chinesas a desenvolver alternativas às tecnologias estrangeiras sob restrição.

Como as empresas podem lidar proativamente com os controles de exportação

O volume e a complexidade crescentes dos controles globais de exportação tornam crucial que os líderes empresariais avaliem o impacto de tais medidas e mitiguem qualquer risco associado a elas. Também devem tentar identificar outras oportunidades competitivas possíveis. Para tanto, as empresas devem considerar as seguintes medidas:

Adaptar o desenho dos produtos já antevendo o risco de controle das exportações

Os gestores devem avaliar se a inclusão de tecnologia sensível em seus produtos poderá sujeitá-los a controles de exportação. Também devem reexaminar, à luz das novas restrições comerciais, suas premissas acerca dos mercados-alvo delineados na proposta de investimento original. Visto que os controles de exportação podem abranger não apenas insumos e componentes, mas até mesmo as ferramentas utilizadas na produção, os líderes empresariais talvez precisem elaborar planos de contingência para todas as cadeias e pipelines de seus produtos.

Reavaliar as cadeias de suprimentos dos produtos existentes

Os executivos devem rever suas cadeias de suprimentos para identificar qualquer dependência de componentes e fornecedores possivelmente sujeitos a restrições. Devem também considerar riscos além da conformidade regulatória. Por exemplo, softwares que verificam se um cliente consta de alguma lista de restrição à exportação não destacarão outras possíveis vulnerabilidades em mercados de exportação atraentes, mas potencialmente de alto risco. Por outro lado, restrições que afetam concorrentes estrangeiros podem representar oportunidades para certas empresas. Por exemplo, em dezembro de 2024, a China proibiu as exportações de gálio, germânio e antimônio para os Estados Unidos em resposta às restrições impostas por este país a investimentos no exterior; no mês seguinte, o governo americano concedeu uma licença de mineração a uma empresa nacional para explorar fontes de antimônio em território americano.

Entender como os controles de exportação podem afetar as operações da empresa (e as dos concorrentes)

Manter-se a par das novas restrições comerciais e alianças geopolíticas, bem como de seus respectivos efeitos nos mercados, é hoje essencial para manter a resiliência corporativa. Os controles de exportação podem afetar não só as cadeias de suprimentos e a capacidade de exportar produtos para mercados específicos, mas também as operações de pesquisa e desenvolvimento, manufatura e pessoal. Por exemplo, os controles impostos pelos Estados Unidos podem ter levado empresas chinesas a investir no desenvolvimento doméstico de tecnologias que não podiam mais importar. Pesquisas mostram que, em média, as empresas chinesas impactadas pelas restrições americanas aumentaram seus gastos com P&D em 16,6% (como percentual das receitas) no ano em que os controles foram introduzidos.

Garantir que as equipes jurídicas e de compliance estejam à altura da tarefa

A função de compliance é essencial para manejar o impacto dos controles de exportação – não apenas para evitar multas onerosas, mas também para criar possíveis vantagens competitivas. Se os profissionais jurídicos e de compliance conhecerem a fundo os controles de exportação, poderão ajudar as empresas a aproveitar novas oportunidades no mercado e enfrentar de modo eficiente a complexidade das regulamentações e dos processos de solicitação de licenças. Por exemplo, em 2019 e 2020, quando o governo dos EUA incluiu empresas chinesas de tecnologia na Lista de Entidades do Departamento de Comércio, os fornecedores americanos dessas empresas enfrentaram a perspectiva de uma redução significativa nas vendas; no entanto, nos seis meses entre novembro de 2020 e abril de 2021, alguns deles, com funções de compliance mais ágeis, rapidamente solicitaram licenças de exportação, a despeito de toda a complexidade do processo, e obtiveram aprovação do Departamento de Comércio para exportar mais de $100 bilhões em semicondutores e afins aos fabricantes chineses sob restrição. Em 2022, quando novos controles foram impostos aos fabricantes chineses de chips, algumas empresas estrangeiras cancelaram suas parcerias, mas a Intel, Samsung, SK Hynix e TSMC, entre outras, obtiveram isenções regulatórias e continuarem a colaborar.


Cada vez mais complexa, a situação dos controles de exportação complica as estratégias globais das empresas. Para mitigar os riscos e, ao mesmo tempo, aproveitar possíveis oportunidades, os gestores devem avaliar o desenho de seus produtos e as estratégias de ingresso no mercado à luz das restrições em constante mudança e antever transformações geopolíticas que poderão gerar novos regulamentos restritivos.

Este artigo é um resumo para fins informativos gerais e não constitui aconselhamento jurídico ou regulatório.

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