Requalificação profissional em escala: um imperativo para o futuro do trabalho

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Em meio à incerteza geral, inclusive acerca do futuro que a IA trará, duas coisas são claras. Primeiro, empregos e profissões vão passar por grandes mudanças à medida que novas tecnologias se tornam capazes de realizar e dar conta de mais tarefas. A transição para a IA já está em andamento, de acordo com os resultados da mais recente pesquisa American Opportunity, da McKinsey: cerca de 20% dos entrevistados empregados afirmam já ter utilizado a IA generativa no trabalho. Segundo, à medida que o trabalho vai se transformando com a adoção de novas tecnologias, a requalificação profissional, ao permitir que as pessoas mudem de ocupação, será ainda mais importante do que é hoje.

Felizmente, ao longo da história, os trabalhadores americanos sempre foram bastante hábeis em mudar de atividade profissional, e o mercado de trabalho dos EUA sempre foi mais ágil e adaptável que o de outras economias avançadas. Entre 2016 e 2019, os americanos mudaram de ocupação quase três vezes mais do que os europeus. A pandemia de COVID-19 foi um período de mudanças ocupacionais bastante aceleradas na Europa, mas mesmo assim os Estados Unidos continuaram a superá-la. Os dados mais recentes da pesquisa American Opportunity (coletados em agosto de 2024) revelam que 17% dos entrevistados empregados americanos mudaram de ocupação desde março de 2020 (veja Box, “Nossa metodologia”).

Dos entrevistados atualmente empregados que participaram da pesquisa American Opportunity, 44% afirmam estar dispostos a mudar de ocupação. Esse número, embora seja menor do que o observado em 2021 (quando chegou a quase 50%), revela o forte interesse dos americanos em buscar salários melhores e mais horas de trabalho – as principais motivações para mudarem de ocupação.

Os trabalhadores americanos têm um longo histórico de buscar novas ocupações e, embora este seja um bom presságio para o futuro, há um problema: dos entrevistados empregados dispostos a mudar de ocupação e abertos a um novo emprego, 45% afirmam que o principal obstáculo a esse novo emprego são as exigências de experiências profissionais, habilidades, credenciais ou formação acadêmica adicionais. Dos entrevistados empregados que buscam, pretendem buscar ou se mostram abertos a um novo emprego, mas não desejam mudar de ocupação, 28% mencionam a mesma dificuldade. A necessidade de requalificação é, de longe, o principal empecilho à mudança profissional citado pelos entrevistados.

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Este artigo analisa a requalificação profissional capaz de tornar os trabalhadores americanos ainda mais flexíveis, adaptáveis e preparados para o futuro. Ao analisarmos o interesse dos entrevistados pela mudança ocupacional, suas aspirações de requalificação profissional e os obstáculos que enfrentam para obter a educação, licenças, estágios ou treinamentos que desejam, esperamos lançar uma luz sobre esse déficit da força de trabalho e inspirar uma reflexão sobre como reduzi-lo ou eliminá-lo. Concluímos oferecendo ideias sobre como empresas, instituições de ensino, organizações não governamentais e programas públicos podem responder ao desejo dos trabalhadores por requalificação profissional e contribuir para a transformação da força de trabalho.

Historicamente, os trabalhadores americanos sempre acolheram – e desejaram – mudanças ocupacionais

Pesquisas anteriores da McKinsey demonstraram que economias avançadas em todo o mundo enfrentam o problema persistente de mercados de trabalho “apertados”,1 até mesmo no setor de infraestrutura e na construção civil. O envelhecimento da população tem reduzido ainda mais o número de trabalhadores disponíveis e, mesmo em um cenário de incerteza, há uma demanda persistente por trabalhadores em áreas específicas, como a saúde. Uma pesquisa do McKinsey Global Institute indica que, em 2030, aproximadamente 10% da força de trabalho dos Estados Unidos talvez precisem mudar de ocupação – cerca de dois pontos percentuais mais do que no período anterior à pandemia de COVID-19.

A pandemia foi um período de muitas mudanças empregatícias e ocupacionais em grande parte do mundo, inclusive nos Estados Unidos, com empresas fechando as portas, trabalhadores enfrentando novas ameaças, novas oportunidades de trabalho remoto surgindo e sociedades inteiras deparando forte turbulência. Embora uma análise histórica dos dados das pesquisas American Opportunity revele que as mudanças de emprego diminuíram desde a pandemia, o impacto desta foi duradouro. Mais de um terço dos entrevistados empregados no terceiro trimestre de 2024 afirma que mudou de emprego depois de março de 2020 e quase um quinto relata ter mudado de ocupação (Quadro 1).

Não chega a surpreender que os entrevistados mais jovens – que investiram menos tempo em suas respectivas áreas de trabalho – sejam os mais entusiásticos em mudar de carreira: 60% expressam disposição para atuar em outro campo. O que talvez seja surpreendentemente é enorme disposição para experimentar algo novo entre pessoas de todos os gêneros, raças, níveis de escolaridade e faixas de renda. O único grupo que diverge perceptivelmente é o dos trabalhadores com 55 anos ou mais, talvez por sentirem que investiram tempo demais no que fazem e estão perto demais da aposentadoria para que a mudança valha a pena. Mesmo assim, um terço dos entrevistados entre 55 e 64 anos – e mais de um quinto entre aqueles com 65 anos ou mais – também se mostrou aberto a mudar de ocupação (Quadro 2).

Querer mudar de profissão significa buscar um futuro financeiro melhor. Quando questionados sobre o que os motiva a buscar um novo emprego, 68% dos trabalhadores dispostos a mudar de ocupação e abertos a um novo emprego são motivados pelo desejo de maior remuneração ou carga horária, e 35% são motivados por melhores oportunidades profissionais. Esses números são 13 e 12 pontos percentuais maiores, respectivamente, do que os de seus colegas que não querem mudar de ocupação.

O ingrediente que falta para mudar de ocupação: requalificação profissional

Com o mercado de talentos aquecido em setores cruciais (como infraestrutura, construção civil e saúde) e um mercado de trabalho em transformação com a crescente adoção da inteligência artificial, a flexibilidade e a adaptabilidade da força de trabalho dos EUA são um bom sinal. Entretanto, uma parcela considerável dos entrevistados prontos para mudar de ocupação e abertos a um novo emprego cita a falta de experiências profissionais adequadas, credenciais, formação acadêmica ou habilidades relevantes como o maior obstáculo para a obtenção de um novo emprego. Esse grupo necessita de requalificação profissional – com certa urgência e em escala (Quadro 3).

Como reflexo desse desejo de requalificação, os trabalhadores dispostos a mudar de ocupação são ligeiramente mais propensos (um a três pontos percentuais) a já ter buscado requalificação profissional no passado, e dez pontos percentuais mais propensos que seus colegas a procurar novas oportunidades de requalificação.

Muitos trabalhadores desejam se requalificar, o que cria um excelente pool de talentos para os empregadores

Entre todos os entrevistados, 42% expressam interesse em requalificação ou afirmam que estão buscando oportunidades de requalificação. Mas em certos grupos específicos, o interesse pela requalificação é ainda maior, revelando bolsões de entusiasmo e motivação que podem se revelar instigantes para os empregadores.

O interesse pela requalificação profissional varia conforme a idade, sendo particularmente elevado entre os trabalhadores mais jovens e ávidos (63% daqueles entre 18 e 24 anos e 53% daqueles entre 25 e 34). Grupos historicamente sub-representados também são mais propensos a desejar requalificação profissional. Entre os entrevistados, 54% dos negros e 49% dos que se identificaram como hispânicos, asiáticos-americanos ou ilhéus do Pacífico relataram seu interesse – cerca de 12 pontos percentuais mais do que seus colegas brancos. Além disso, indivíduos de baixa renda (renda familiar anual inferior a $50 mil), residentes em áreas urbanas e imigrantes de primeira ou segunda geração são, respectivamente, oito, oito e 16 pontos percentuais mais propensos a buscar requalificação profissional do que seus pares de alta renda, suburbanos2 ou rurais, e não imigrantes. Mesmo entre os grupos que demonstram comparativamente menos entusiasmo (excluindo os entrevistados com 35 anos ou mais), o interesse pela requalificação profissional oscila em torno dos 40% (Quadro 4).

Trabalhadores que buscam aprimorar suas habilidades constituem um grupo de talentos altamente motivado e cobiçado pelos empregadores. Embora a meta principal desse grupo seja melhorar suas perspectivas profissionais, o “interesse pessoal em aprender algo novo” foi o segundo fator mais citado pelos mais de 40% dos trabalhadores com idades entre 25 e 64 anos interessados em requalificação. Em vista do mercado de trabalho “apertado”, trabalhadores experientes que também desejem continuar se aprimorando podem ser particularmente valiosos para os empregadores – que poderão se beneficiar de canais de recrutamento que incluam trabalhadores mais jovens e imigrantes.

Tempo e custo são obstáculos para trabalhadores que buscam requalificação

Dada a vontade generalizada de buscar requalificação profissional, é lamentável que quase metade dos entrevistados que desejam se aprimorar cite como os principais obstáculos (muito mais do que qualquer outra barreira) a falta de tempo e os custos elevados da requalificação.

O tempo é uma questão particularmente problemática para trabalhadores mais experientes e estabelecidos: cerca de metade dos entrevistados na faixa etária de 35 e 64 anos e renda familiar anual superior a $100.000 afirma que a falta de tempo é um impedimento. Além do tempo e do alto custo da educação, outros dois obstáculos financeiros estão entre os mais citados: acesso a apoio financeiro e o custo de oportunidade relacionado a salários perdidos. O acesso ao transporte também representa uma complicação para 14% dos entrevistados com idade entre 18 e 24 anos, 13% dos entrevistados com renda anual inferior a $50.000 e 11% dos entrevistados negros. Em comparação, apenas 6% da totalidade de entrevistados indicam que o transporte constitui um desafio.

É inquietante que 10% de todos os entrevistados afirmem haver obstáculos ligados à saúde mental, para não falar que os entrevistados mais jovens são duas vezes mais propensos a citar esse problema. Esses dados são consistentes com estudos do McKinsey Health Institute, segundo os quais as gerações mais jovens são as mais propensas a afirmar que sofrem de problemas de saúde mental (Quadro 5).

As empresas terão papel importante na próxima onda de requalificação profissional

Empresas privadas e organizações sem fins lucrativos têm a oportunidade de desempenhar um papel importante em uma nova onda de requalificação profissional. Os entrevistados que pretendem se requalificar em um futuro próximo recorrem com mais frequência a instituições de ensino (41%), empresas privadas (35%) e organizações sem fins lucrativos (23%) para obter acesso a oportunidades de emprego e de capacitação. Entre os entrevistados que não planejam se requalificar no próximo ano, 32% afirmam que buscariam o apoio de empresas privadas (Quadro 6).

Trabalhadores e empregadores podem colaborar para atingir as metas de requalificação profissional

Visto que os trabalhadores enfrentam barreiras de tempo e custos para se requalificar profissionalmente, é razoável que muitos deles tenham a esperança de receber treinamento enquanto trabalham em empresas privadas. Afinal, as empresas não só estão em posição de apresentar soluções criativas para os horários de seus funcionários e de ressarcir os custos envolvidos (ainda mais considerando que elas próprias só têm a ganhar com profissionais mais qualificados), como geralmente também estão em sintonia com seus objetivos profissionais, podendo ajudá-los a adquirir as habilidades necessárias para atingi-los.

Empregadores e ONGs podem adaptar os métodos de requalificação para dar conta de limitações e metas específicas

Empresas e organizações sem fins lucrativos que queiram criar oportunidades de requalificação devem adaptar para cada público-alvo tanto o seu modo de alcançar as pessoas como a estrutura de seus programas. Por exemplo, programas de meio período ou treinamentos assíncronos autoguiados permitem a participação de trabalhadores com pouco tempo disponível; por sua vez, programas hospedados online (como séries de vídeos gratuitos) tornam possível que jovens trabalhadores iniciem sua requalificação com poucas barreiras iniciais.

Dados de pesquisas revelam que, em maior proporção que seus colegas mais jovens, os trabalhadores mais velhos (entre 55 e 64 anos) preferem plataformas online, como a Coursera, para obter certificações. Embora os entrevistados mais jovens também tenham preferência por essas plataformas, um número comparativamente maior deles está aberto a aprender por meio de mídias sociais como LinkedIn e YouTube. As organizações precisam atentar a essas nuances de seus públicos-alvo para elaborar ofertas mais atraentes.

Embora certificação, educação superior, licenciamento, credenciamento e treinamento sejam os meios mais populares de requalificação, a opção preferida depende da ocupação pretendida. Por exemplo, os entrevistados interessados em operações financeiras ou comerciais tendem a buscar com mais frequência algum tipo certificação. Por sua vez, aqueles que querem migrar para cargos gerenciais têm interesses de requalificação mais variados, desde licenciamento e credenciamento até certificação e treinamento (Quadro 7).

Empregadores, organizações sem fins lucrativos e organizações educacionais devem se concentrar em eliminar as barreiras – principalmente a falta de tempo e de dinheiro – para contarem com uma força de trabalho mais qualificada. Além disso, podem se esforçar para atrair futuros trabalhadores (por exemplo, organizando feiras de profissões e convidando antigos profissionais para dar palestras aos funcionários) a fim de encontrar aqueles que se sentirão atraídos por programas de requalificação.

Para amenizar as limitações de tempo, os empregadores podem oferecer horários de trabalho flexíveis e algum tipo de auxílio-transporte (ou mesmo fretamento de ônibus ou vans). Por sua vez, as ONGs, em parceria com os empregadores, podem desenvolver programas personalizados de diagnóstico vocacional e requalificação profissional, bem como iniciativas de recolocação em organizações de grande porte.


O futuro do trabalho será moldado pela inteligência artificial e implicará ainda mais mudanças ocupacionais do que as observadas nos últimos anos. Contudo, os trabalhadores americanos – em grau bem mais elevado que seus pares de outras economias avançadas – possuem um longo histórico de vontade e disposição de mudar de emprego e ocupação. E têm se mostrado dispostos a mudar ainda mais, especialmente se puderem contar com salários maiores, horários de trabalho melhores ou mais oportunidades de avanço profissional. Os resultados da pesquisa American Opportunity indicam que os principais obstáculos à requalificação profissional são a falta de tempo e de dinheiro ou a perspectiva de terem de sacrificar parte de seus salários.

Resolver o impasse da requalificação profissional não é simples, mas nem é intransponível. Um esforço concentrado visando melhorar as opções para os trabalhadores americanos pode ser um catalisador para as mudanças ocupacionais necessárias para adequar a força de trabalho e as habilidades atuais aos empregos do futuro. É hora de começarmos a encontrar soluções.

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