O CEO como diretor de resiliência

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A resiliência é fundamental para toda organização diante do atual estado de incerteza e crise permanentes em que a maioria das pessoas e equipes atua. No entanto, pesquisas da McKinsey sugerem que muitos líderes e organizações não estão dedicando tempo suficiente para desenvolver essa resiliência. Não menos que 84% dos líderes afirmam se sentir despreparados para futuras disrupções e 60% dos membros de Conselhos dizem que suas empresas não estão prontas para o próximo grande evento.

Conversas com CEOs de empresas globais revelam que a maioria permanece focada em enfrentar situações agudas e inesperadas que impactem seus negócios – grandes crises (como mudanças na política comercial global, conflitos na Europa e no Oriente Médio, e disrupções ideológicas e geopolíticas que acarretam consequências financeiras e operacionais) e também disrupções menores (como flutuações no preço das ações ou defeitos em produtos).

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Embora o tempo seja sempre um fator restritivo para os CEOs, eles precisam dedicar esforço e atenção para criar resiliência, que definimos como a capacidade de se preparar para disrupções, de responder a elas e de saber como aproveitá-las. Pesquisas mostram que quase metade do desempenho de uma empresa está atrelada à liderança do CEO. E embora outros líderes também contribuam para desenvolver a resiliência organizacional – como o gestor de riscos, o CFO e o diretor de RH –, somente o CEO possui a perspectiva holística necessária para avaliar o nível de resiliência da empresa, aumentá-lo e integrá-lo ao DNA organizacional.

Acreditamos que existem quatro tipos principais de resiliência – financeira, operacional, organizacional e externa – e que os CEOs devem compreender todos eles para efetivamente fortalecer a resiliência da empresa (veja Box, “Os quatro tipos de resiliência”).

Se os CEOs conseguirem entender melhor essas diferentes dimensões da resiliência, poderão tomar cinco medidas capazes de tornar suas instituições mais fortes e menos suscetíveis a choques. As medidas que sugerimos baseiam-se em nosso convívio e conversas com CEOs de todo o mundo e na pesquisa longitudinal sobre o tema que realizamos ao longo da última década.

  • Incorporar resiliência à visão da empresa. Crie um vínculo inextricável entre a estratégia e níveis de resiliência da organização.
  • Criar resiliência integral. Dedique atenção a todas as dimensões da resiliência organizacional e avalie como e onde elas se complementam e se reforçam mutuamente.
  • Exigir decisões da alta liderança quando a resiliência estiver em risco. Nos momentos mais críticos, intervenha diretamente, enfatizando a importância da resiliência nas decisões diárias e nas iniciativas estratégicas – e, se necessário, até mesmo compelindo os líderes a agir.
  • Formar uma equipe com garra e investir na resiliência pessoal. Contrate e desenvolva pessoas que demonstrem atitudes e comportamentos adaptáveis, disposição de enfrentar desafios e compromisso com essas características e práticas. E aja de modo a servir de modelo para elas.
  • Criar relações mais profundas com um grupo diversificado de stakeholders externos. Já antevendo futuras disrupções, construa parcerias sólidas que permitam à organização contar com o apoio de stakeholders externos quando as mudanças ocorrerem. Essas alianças podem ser particularmente cruciais quando as empresas estudam mudanças ousadas na estratégia em resposta a eventos internos ou externos.

Neste artigo, examinamos cada uma dessas ações e o papel decisivo do CEO na criação de resiliência. Acreditamos que os CEOs que priorizarem essas cinco medidas e promoverem a resiliência em suas organizações terão melhores condições de capturar oportunidades de crescimento no curto e médio prazo – e também mais chances de construir negócios duradouros e voltados para o futuro.

Incorporar resiliência à visão da empresa

Pesquisas da McKinsey mostram que uma empresa tem quase o dobro de chances de apresentar um desempenho superior à média se a equipe de liderança atuar em sincronia e compartilhar uma visão comum. O CEO é responsável por definir essa visão e criar uma estrela-guia capaz de mobilizar a equipe. Contudo, pode ser difícil reunir todos em torno de uma visão unificada quando as coisas estão em constante mudança. De acordo com estudos do Fórum Econômico Mundial e da McKinsey, mais de 40% das empresas comunicam sua visão e valores de maneira inconsistente durante períodos de incerteza.

Os CEOs devem recalibrar a organização de modo a fortalecer a resiliência – mesmo (e especialmente) em tempos difíceis. Devem dar o tom para todos na organização. Para fazer isso bem rotineiramente é preciso aderir a alguns princípios fundamentais: equilibrar as perspectivas de curto e de longo prazo, levar em conta o ciclo econômico completo, vincular inextricavelmente resiliência e crescimento, e introduzir proativamente estressores no sistema.

Equilibrar os horizontes temporais e considerar o ciclo econômico completo

Alain Bejjani, ex-CEO da Majid Al Futtaim, conversou com a McKinsey sobre a importância de manter “um olho no microscópio e o outro no telescópio”. Os CEOs devem monitorar continuamente os negócios para identificar consequências não pretendidas ou efeitos de segunda ordem decorrentes de disrupções – o chamado “segundo quique da bola” – que possam afetar a posição da organização. Se as coisas não estiverem indo como planejado, os CEOs mais eficazes sempre têm o longo prazo em mente quando determinam se devem mudar de direção e como fazê-lo. Eles entendem que, em certos casos, manter o curso pode ser a melhor opção, mesmo que signifique abrir mão de ganhos imediatos para preservar o impacto de longo prazo.

Esse foi o caso do CEO de uma firma de serviços financeiros que continuou contratando profissionais para funções críticas mesmo quando as receitas começaram a cair durante o lançamento de uma nova iniciativa estratégica. O CEO reconheceu que talentos de alto nível, com novas perspectivas e experiências diversas, seriam essenciais para o sucesso da iniciativa e para posicionar a organização para crescer no futuro. Ele se ateve à visão de longo prazo e ao plano de contratação da equipe de liderança – e, com o tempo, as receitas acabaram se recuperando.

Criar um vínculo direto e permanente entre resiliência e crescimento

A maioria dos CEOs mais eficazes prioriza o crescimento, sendo que 72% deles definem metas superiores à média do mercado. Por reconhecerem que a resiliência é capaz de impulsionar a inovação e o crescimento em cenários altamente dinâmicos e disruptivos, esses líderes de alto desempenho se envolvem profunda e sistematicamente nas fases de planejamento e preparação. Assim como os melhores atletas, aproveitam períodos de relativa calma para aprimorar e desenvolver as capacidades que melhorarão o desempenho da organização no longo prazo.

Os CEOs fariam bem em considerar maneiras de injetar estressores no sistema – cenários hipotéticos, pré-mortems, simulações e similares – para avaliar o grau de prontidão de suas organizações. Os dados obtidos com essas iniciativas podem ajudar os CEOs a determinar tanto os níveis atuais de resiliência como os que serão necessários no futuro. Reed Hastings, ex-CEO da Netflix, desafiava regularmente sua equipe a considerar o seguinte cenário: “Já se passaram dez anos e a Netflix faliu. Calcule a probabilidade das diferentes causas possíveis.” Por sua vez, Sarah Friar, ex-CEO da Nextdoor, realizava costumeiramente exercícios para avaliar de que forma os lançamentos de novos produtos poderiam “ir por água abaixo” e organizava encontros de vários dias fora da empresa para examinar holisticamente os problemas corporativos. Tais testes direcionados, ensaios e simulações podem ajudar os CEOs a elaborar um programa abrangente para fortalecer e preservar a resiliência organizacional.

Criar resiliência integral

Assim como o desenvolvimento físico do ser humano, o desenvolvimento das organizações tende a ser desigual: nenhuma empresa será igualmente forte em todas as quatro dimensões da resiliência – financeira, operacional, organizacional e externa. Mas também nenhuma empresa escapará ilesa se tiver áreas superdesenvolvidas e outras negligenciadas. Por exemplo, uma organização poderá focar a melhoria dos processos em detrimento do desenvolvimento dos talentos certos para implementá-los. Ou uma “cultura de heróis” poderá surgir em outra organização, que passará a depender excessivamente da intervenção de alguns indivíduos ou grupos para corrigir problemas quando as coisas dão errado, resultando em fadiga organizacional e burnout.

O que os CEOs precisam fazer é conectar claramente a visão da empresa às tarefas diárias dos funcionários, que assim poderão ver como suas funções se relacionam com o propósito da organização e, portanto, se adaptar melhor e perseverar em épocas de turbulência.

Especificamente, os CEOs devem pensar em uma resiliência organizacional integral. Essa abordagem permitirá o desenvolvimento equilibrado da resiliência em todas as partes da empresa, com o CEO monitorando continuamente as condições operacionais e atento a qualquer sinal de distensão, desgaste ou atrofia. Nesses casos, o CEO poderá recorrer a um plano de crise e processos robustos previamente estabelecidos, adaptando-os para lidar com cada disrupção específica, em vez de depender da intervenção de alguns indivíduos “heroicos” para salvar a situação.

Além da implementação de processos mais robustos, há um outro aspecto crucial na criação da resiliência integral: o CEO deve se tornar um “estudioso de crises”, ou seja, alguém que, após uma crise, aprende rapidamente com a experiência e implementa mudanças que assegurem a saúde e o bom desempenho da organização no futuro. Um bom exemplo vem do setor de tecnologia: depois que uma atualização de software provocou um apagão cibernético global, o CEO da CrowdStrike, George Kurtz, lançou um projeto que chamou de “resiliente por natureza” [resilient by design] alicerçado em três pilares: um pilar fundamentador (para incorporar práticas de resiliência a cada processo e sistema), um pilar adaptativo (customizando o software da CrowdStrike às necessidades de segurança de cada setor) e um pilar de aprimoramento contínuo (que busca melhorias constantes). “Buscar resiliência não é opcional”, diz Kurtz. “É essencial para todos nós.”

Exigir decisões da alta liderança quando a resiliência estiver em risco

Nas horas mais críticas de uma empresa, o CEO deve intervir diretamente, ressaltando a importância desses momentos para as decisões do dia a dia e as iniciativas estratégicas. Se necessário, deve até mesmo compelir os líderes a agir. Foi o que fez o CEO de certa empresa quando a alta liderança estava às voltas com uma iniciativa que demandava muito capital. Ele questionou incisivamente os gestores: “Estamos garantindo que o sistema terá flexibilidade suficiente? De que forma essa iniciativa contribui para o nosso portfólio geral? Estamos capacitando a linha de frente com esse investimento e ela será capaz de executar adequadamente o plano?” De maneira similar, outra CEO questionou a recomendação da equipe de liderança de contratar apenas profissionais externos para uma iniciativa estratégica. Ela perguntou: “Que mensagem estaremos enviando a nossos funcionários se nós sequer considerarmos a possibilidade de promoções internas?” Esses dois CEOs souberam equilibrar uma discussão construtiva com ações decisivas, ambas essenciais para construir resiliência. Segundo uma pesquisa da McKinsey, a determinação é fundamental para melhorar a saúde organizacional. Na verdade, comparadas com seus concorrentes, empresas com líderes decisivos têm 4,2 vezes mais chances de serem saudáveis.

Formar uma equipe com garra e investir na resiliência pessoal

Quando se trata de criar e sustentar a resiliência organizacional, caráter e adaptabilidade são tão ou mais importantes que credenciais e histórico profissional. Por exemplo, na esteira de inovações no modelo de negócio, de mudanças geopolíticas ou da disrupção causada pela IA ou outras tecnologias, é muito possível que as regras, habilidades e especificações que haviam funcionado para as organizações não sejam mais adequadas ou suficientes. Um dos papéis fundamentais dos CEOs é, portanto, desenvolver ativamente uma força de trabalho adaptável e identificar a próxima geração de líderes e funcionários inovadores. Para tanto, devem criar os parâmetros com os quais testar, aprimorar e desafiar os indivíduos a inovar e crescer; e com os quais modelar e celebrar comportamentos resilientes e manter a resiliência pessoal.

Criar os parâmetros para formar equipes resilientes

Os CEOs devem trabalhar com equipes de atração de talentos e outros líderes funcionais para identificar as características resilientes necessárias para que a organização tenha sucesso em tempos de disrupção – como tenacidade, agilidade e garra. Os CEOs devem garantir que essas características sejam incorporadas a todas as conversas ao longo do ciclo completo da gestão de talentos: desde a atração até a retenção e o desenvolvimento de liderança. Como Lila Snyder, CEO da Bose, disse à McKinsey em uma entrevista de 2023, em tempos de disrupção e transformação “você precisa de pessoas que tenham um nível de garra e resiliência superior ao que se precisaria para gerir o negócio em situações estáveis”. E acrescentou: “Tenho buscado pessoas com o gene da mudança, para as quais o desejo de mudar é o elemento-chave de tudo o que fazem”. Esse era também o objetivo de Eric Olson, ex-almirante da Marinha dos EUA, quando desenvolveu o que chamou de estrutura “Big Four” – definição de metas, simulações mentais, diálogos subjetivos e manutenção da calma – para formar times resilientes de Navy SEALs. “Buscamos pessoas que saibam que sempre existe uma maneira de resolver um problema”, afirma. “[Os SEALs] são formados por indivíduos que, sem hesitar, são capazes de se desencantar do plano principal e adotar um plano B ou elaborar um novo. Se o mapa diz uma coisa e o terreno mostra outra diferente, eles seguem o terreno, não o mapa.”

Modelar e celebrar comportamentos resilientes

Um dos papéis fundamentais dos CEOs é praticar os comportamentos necessários para desenvolver resiliência. Por exemplo, é importante que mantenham a compostura em momentos de disrupção – absorvendo, não amplificando, o estresse. Por outro lado, com base em nossas pesquisas e experiência, é igualmente importante que demonstrem vulnerabilidade, pois é assim que gerarão confiança, formarão relações mais robustas com as equipes e injetarão segurança psicológica na organização. Brad Smith, ex-CEO da Intuit, colava no vidro de seu escritório as avaliações de seu próprio desempenho realizadas pelo Conselho e as enviava por email aos funcionários, instruindo-os que o advertissem caso o vissem tendo qualquer uma das atitudes negativas citadas em sua avaliação e recebendo de braços abertos esse tipo de feedback. Logo, toda a sua equipe de liderança estava compartilhando suas respectivas avaliações de desempenho. A transparência incentivava as pessoas a experimentar e assumir riscos, criando um ambiente em que as equipes se sentiam seguras para inovar.

Manter a resiliência pessoal

Para se tornarem bons exemplos de resiliência, os CEOs devem primeiro olhar para dentro de si e se perguntar: “O que eu faço para assegurar a minha eficácia pessoal?” Na maioria dos casos, os CEOs desenvolvem e mantêm a resiliência pessoal adotando uma visão de longo prazo e buscando o apoio de aliados confiáveis. A ex-CEO de uma firma de serviços financeiros atribui o seu sucesso em lidar com questões delicadas durante a transformação da empresa a um “gabinete informal” de consultores – um pequeno grupo que incluía seu marido, seu ex-chefe, um antigo colega de consultoria e dois amigos de confiança. Esse grupo lhe fornecia perspectivas diferentes, contestava suas convicções e a ajudava a refletir sobre decisões críticas.

Criar relações mais profundas com um grupo diversificado de stakeholders externos

O engajamento com o mundo externo é um dos aspectos do cargo de CEO que mais mudou no século 21. Sendo a principal voz e rosto da organização, espera-se cada vez mais que lide com questões globais complexas que tenham implicações profundas nos negócios – como as recentes mudanças geopolíticas, demográficas e tecnológicas. Contudo, embora quase 60% dos líderes empresariais acreditem que as empresas têm a responsabilidade de atuar em questões sociais, mesmo as mais delicadas ou controversas, apenas 6% se sentem confiantes de que suas organizações estão tomando as medidas corretas.

Em uma época em que toda ação tende a ser esmiuçada por todos, os CEOs devem ter como meta não apenas sobreviver, mas também moldar interações essenciais e o sentimento público. Isso requer investimento contínuo na construção da reputação e na gestão de stakeholders – fornecedores, concorrentes, investidores e jornalistas, por exemplo. Como explicam Neil Blumenthal e Dave Gilboa, co-CEOs da Warby Parker, “colaborar em decisões importantes e manter uma comunicação transparente com os stakeholders” é fundamental para estabelecer e preservar a confiança. Tais esforços ajudam os stakeholders externos a distinguir entre erros de juízo (lapsos momentâneos incompatíveis com os valores da organização) e erros de princípio (que indicam falhas sistêmicas e generalizadas).

Os CEOs de hoje precisam criar uma estratégia e uma plataforma para stakeholders externos que permitam interações autênticas com todos eles e sejam focadas no propósito da empresa. Precisam articular uma narrativa única que inspire ação, promova alinhamento e defina o caminho a seguir, colaborando com funcionários, parceiros e aliados. Por exemplo, Kate Walsh, ex-CEO do Boston Medical Center, conferenciou com seus colegas no início da pandemia, quando Boston se tornou um dos epicentros de COVID-19 no país. “Os CEOs de todos os hospitais logo perceberam que estávamos competindo uns aos outros na cadeia de suprimentos”, relembra. “Assim, passamos a coordenar nossos esforços para, pelo menos, avisar nosso pessoal que cada um receberia uma máscara quando viesse trabalhar na segunda-feira de manhã. Essa interação acabou se transformando em chamadas quase diárias [para outros hospitais], enquanto tentávamos descobrir como responder adequadamente ao volume de casos.”


Os CEOs de hoje sabem que disrupções são inevitáveis – não é uma questão de “se”, mas de “quando”. Também entendem que a forma como respondem inicialmente às crises é importante, mas que ainda mais crucial é o que aprendem com elas e como se posicionam – e às suas equipes e organizações – para se recuperarem da disrupção e seguirem em frente. Nossa pesquisa e experiência sugerem que CEOs que se mostrarem à altura e investirem na resiliência como um imperativo estratégico terão a confiança necessária para buscar oportunidades de negócios audaciosas, inovar mais, crescer mais rapidamente, inspirar as equipes a superarem seus limites, e realizar o pleno potencial de suas organizações.

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